terça-feira, 23 de agosto de 2011

Leonardo Sakamoto: “Sim, nós temos escravos. E lucramos com eles”


Jornalista e doutor em Ciência Política, já cobriu conflitos armados e desrespeito aos direitos humanos no Timor Leste, Angola, Paquistão e Brasil. O que viu e sentiu o levaram à fundação da ONG Repórter Brasil. É membro da Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo e colunista do portal Uol. Sakamoto vai falar sobre a dura realidade de quem acredita na ilusão de uma vida melhor para acabar preso, isolado, explorado e abandonado em algum confim do Brasil – sob a ganância, a tortura física e psicológica alheias.

Entrevista produzida por Gabriela Azevedo e publicada no Diário do Pará de 21 de agosto de 2011:

Em nome da liberdade


“O Pará é um Estado que tem muitos problemas, mas que é muito rico. O povo é guerreiro e essa é a esperança do Estado.”
De acordo com os dados divulgados em janeiro pelo Ministério do Trabalho, o Brasil tem 251 empresas na lista dos empregadores de mão de obra escrava. O Pará é o líder da lista, com 27 empresas. Os escravos foram abolidos há 123 anos e, na era em que vivemos, números tão altos protestam contra o nosso conformismo. Leonardo Sakamoto é um jornalista indignado com essa situação. Ele fundou a ONG Repórter Brasil que pesquisa e denuncia o trabalho escravo. Sakamoto estará em Belém para o TEDx Ver-o-peso, em agosto. Quem foi selecionado para o evento vai conhecer a iniciativa de Sakamoto, quem não pode descobrir um pouco mais nessa entrevista exclusiva para a coluna.


Quando você decidiu que o trabalho escravo era o tema que merecia sua atenção?

Não houve um momento específico. Eu sempre me interessei e trabalhei na área de direitos humanos. É claro que quando você se depara com uma grave violação de direitos humanos você se revolta. E não tem maior violação dos direitos humanos que o trabalho escravo. Ele agride a sua liberdade a sua dignidade. Fui narrando isso, trabalhando com isso aonde via. Faz mais de 12 anos que eu trabalho reportando denúncias de trabalho escravo.

Esse TEDx vai acontecer no estado com maior índice de trabalho escravo do país. Como você vê essa discussão hoje em dia? É um assunto que ainda precisa suscitar mais debates?

O acesso à informação sobre isso melhorou muito nos últimos anos, mas é claro que só melhorou se compararmos a uma época em que ninguém sabia de nada. Antes as pessoas achavam que o trabalho escravo havia acabado. Uma discussão como essa no Pará contribui para aumentar a informação. Mas não é apenas para lembrar que o problema existe, é para informar que depende da ação de cada um o fim dele.

O TEDx Ver-o-peso vai falar dos jeitos diferentes de viver. Você considera que faz um jornalismo diferente, que tem um diferente jeito de viver?

A minha vida é não-convencional. Não apenas pelo assunto com o qual eu trabalho, a escravidão, mas por causa dos direitos humanos. Eu rodo o Brasil todo, para reportar e denunciar. É interessante, mas muito intenso. Estou em contato com muitas tristezas sempre que me deparo com a notícia. É preciso pensar e refletir muito para encarar essas tristezas, se não você passal mal com tudo o que vê.

E quanto a programação para Belém, o que você está planejando para a palestra?

Em Belém quero mostrar para a sociedade o que é o trabalho escravo e como ele está inserido no nosso dia-a-dia. O trabalho escravo está no nosso consumo, está na casa do brasileiro. Ele não uma realidade do interior, de Marabá ou Carajás, por exemplo. O trabalho escravo está na capital. Quero mostrar como ajudamos a combater esse tipo de exploração.


Aproveitando que você vai estar no Pará, está pensando em esticar para realizar algum projeto da ONG?

Temos um programa no Pará. Desde 2004 a ONG opera o programa “Escravo, vem pensar!”. Com ele já formamos 3000 professores, inclusive no Pará. A ideia é que eles se tornem multiplicadores de informações pra esclarecer as dúvidas sober o trabalho escravo. Temos muitas parcerias com instituições locais para garantir que o programa seja melhor. O Pará é um estado que tem muitos problemas, mas que é muito rico. O povo é guerreiro e essa é a esperança do Estado. Ainda falta informação, mas quando ela estiver acessível a gente pode conseguir resolver o problema. Podemos ter uma grande cabanagem, quem sabe.


Para mais informações sobre o TEDxVer-o-Peso


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